Muitas vezes me pego preocupado com meu futuro, o futuro
de minhas relações e claro o sucesso de uma vida amorosa. Um norteador ou uma conversa
podem ter efeitos extremamente benéficos na vida de uma pessoa.
Explorando o seu site vi uma mensagem pedindo que escrevessemos nossas histórias, e decidi fazer esse exercício, descobrindo ao final o quanto poderia
ser interessante tal atividade.
Meu nome é Paulo, tenho 30 anos e venho de uma família humilde do
interior de SP. Desde muito cedo em meu mundo interior eu sentia que era uma
pessoa diferente e até meados da adolescência não sabia bem o motivo.
O fato é que morando em um sítio e vivendo em um bairro da zona rural,
tudo parecia fadado a ser muito complicado, ainda mais para uma criança que não
se encaixava no grupo ao qual vivia.
Cresci com minha avó, apesar de meus pais estarem casados até hoje, e
carrego uma bagagem emocional muito grande pela minha convivência com ela: era
a única pessoa a demonstrar carinho, cuidado e proteção por mim.
Um dia minha mãe foi chamada na escola e a diretora alertou que havia
algum problema comigo, que eu não era como os outros meninos. O cabelereiro do
vilarejo zombava abertamente de mim e na mercearia havia um atendente
que me humilhava toda e qualquer vez que por ventura lá aparecesse. Não havia
escapatória.
Eu era uma criança sensível, delicada e isso atraía uma enxurrada de
insultos dos colegas de escola. Por medo e vergonha, andava em meio a mata que
circundava o bairro para chegar ao nosso sitio e assim fugir dessas pessoas.
Mudei de colégio e fui estudar em uma cidade maior. Lá enfrentei dolorasamente o bulling, que na época nem tinha esse nome e esse conceito. Era agredido diariamente com os nomes mais
pejorativos e vulgares. Nessa época nem sabia o que era sexo, mas o estigma gay
me feria duramente.
Passei a estudar muito, ter meus livros como únicos amigos e conforto na religião, frequentava assíduamente a paróquia do meu
bairro.Obviamente nunca estava em paz, era perseguido o tempo todo por
olhares e insultos.
Comecei a trabalhar como auxiliar de jardinagem aos 14 anos para poder
concluir o ensino médio. Nessa época fui expulso de casa sem nem saber
o motivo. Morei um tempo com minha tia e logo minha mãe me acolheu de volta.
Ensaiei alguns namoros com meninas, mas era muito mais um amigo para elas e isso atrapalhava.
Um dia fui beijado, sem esperar, sem reagir, sem procurar. Foi
em uma madrugada, numa pista de uma boate hétero de minha cidade que beijei
pela primeira vez um homem.... Descobri naquele momento que eu nunca mais
seria o mesmo.
Contei aos meus pais e enfrentei pouquíssima resistência por parte
deles... Contei mesmo. Me assumi aos 18 anos e comecei a experimentar a felicidade.
Não porque havia encontrado alguém afinal esse homem que me beijou NUNCA mais
fois visto, nunca mais o beijei... Brinco que ele foi um anjo que me deu a
chave da aceitação.
Quando me aceitei decidi que jamais iria ser escravo do preconceito novamente.
Meses depois conheci um garoto, 3 anos mais velho e decidimos viver uma
história. Fomos aceitos por todos e um tempo depois fomos morar juntos.
Houveram muitas brigas, mentiras e decepções, mas havia amor.., O meu
primeiro amor.Três anos se passaram e numa tarde qualquer em um
consultório médico ele é diagnosticado com câncer e um paciente terminal. Eu nem imaginava que da descoberta até o fatídico fim teríamos apenas seis meses
juntos.
O chão se abriu. Mal pude suportar o peso tão grande, pois além disso minha avó faleceu antes dele. Perdi meu
referencial de carinho e quem eu mais amava estava a beira da morte sem que
nada pudesse ser feito.
Foi quando morri pela primeira vez...
Ela morreu em março, ele em junho e o preconceito impediu inclusive que
eu me despedisse dele. A família dele proibiu minha entrada no funeral.
Um novo Paulo deu lugar ao antigo, precisei caminhar enquanto chorava e
caminhando me entreguei ao estudo e ao trabalho.
E foi pelo trabalho que encontrei braços deliciosamente confortáveis em
um homem 30 anos mais velho. Um colega, meu superior, passou a se mostrar interessado e
o improvável aconteceu e se repetiu.
Nessa repetição, tornou-se amigo, amante, confidente, professor, e aos
poucos a dor foi cedendo lugar à paixão. Meses depois estava eu apaixonado e
ele adepto ao relacionamento sem rótulo alegando que havia sofrido demais em
relacionamentos anteriores.
Depois vieram as cobranças, as primeiras brigas, mágoas
insolúveis e a primeira ruptura. Ele afirmava não querer relacionamento e eu
cada vez mais dependente, e apaixonado não aceitava não ter um papel definido.
Houveram dois, três recomeços... Ele mudava a cada
retorno, aceitou o relacionamento, aceitou casar como era meu desejo e assumir
a todos o meu papel ao seu lado como marido.
Mas tantas mágoas, tantas comparações que ele fazia com seus antigos namorados, e a convivência quase que diária com
esses personagens, foi tingindo de cinza a relação.
Houve amor ...mas um abismo se instalou entre nós. Eu
sem ser acertivo, ele sendo dono de uma verdade falida.
E na última página de um livro de ouro, que eu imaginar ter escrito, foi escrito com linhas negras a última briga...e a última
frase:
-Nunca mais quero olhar na sua cara!!!
Foi quando morri pela segunda vez...
Renasci, redescobri antigos amigos, fiz novos amigos, fiz viagens, estudei, trabalhei, cuidei da minha família...
Sigo reinventando-me, redescobrindo-me e mesmo com um passado ainda
tão presente, permaneço fiel ao meu desejo de também me reencontrar em um relacionamento
feliz.
Comentários
Postar um comentário
Deixe seu comentário: